quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Feijão



Na faculdade, após a euforia das primeiras semanas de aula, era comum a formação de grupos de amigos que tinham mais afinidades entre si, e não era raro a formação de duplas inseparáveis. Algumas até bem conhecidas como o Bola e o Cabeção, Clovis e Sorocaba, Bozó e Japa e... Feijão e BG.

Tive a honra de conhecer o Feijão em março de 1994. Era o primeiro dia de aula dos calouros da FAMEMA, e eu ainda tinha dúvidas se continuaria no curso...

Era um menino magro, com olhar inocente, destes que são criados sob as asas da mãe e superprotegidos pela avó. Estava perdido, amedrontado, envergonhado e ansioso, como a maioria de nós diante de um novo desafio, e ainda mais quando se é obrigado andar 5 quarteirões até chegar ao terminal de ônibus, vestindo meia arrastão, saia e batom.

A convivência mostrou que aquele rosto inocente era também muito inteligente, e logo adaptou-se a nova vida universitária. No entanto, perdido no sentido literal da palavra, nem o tempo melhorou... tanto que cogitei várias vezes em presenteá-lo com uma bússola. Foram muitas as aventuras e desventuras que talvez eu conte um dia.

Os seis anos seguintes só fortaleceram a nossa amizade... e era muito comum sermos confundidos um com o outro... mas a única explicação que tenho para isso, é só pelo fato de andarmos juntos, pois o Feija's estava sempre alegre, bem humorado, conversador e na maioria das vezes tinha uma piada para contar, e eu infelizmente nunca fui assim...

Relacionava-se bem com todos, mas sabia ser sarcástico quando não gostava de alguém, e era tão sutil e inteligente que nem a pessoa percebia que estava sendo caçoada.

Mas a verdade de tudo isso é que talvez o  Feija´s não fosse tão feliz assim... e eu talvez não fosse um bom amigo... Nunca perguntei sobre suas angústias, e no fundo acho que se nos dávamos bem, era porque respeitávamos as nossas individualidades.

O fato é que aquela época passou e muitas outras coisas aconteceram após a formatura. Seguimos caminhos diferentes, embora sempre que possível nos falávamos.

Um dia o convidei para vir até minha casa nova, junto com outros amigos para recordar os velhos tempos da faculdade, e ninguém melhor que o Feijão e o Bozó para narrar aquelas histórias, mesmo que na maioria das vezes eu fosse o motivo das piadas...

Mas o Feija´s disse que não poderia ir. O seu tom de voz estava diferente, um pouco frio e distante, mas ao mesmo tempo com um tom de culpa por ter marcado viagem neste dia (esse sempre foi o problema do Feijão, querer agradar a todos...). Nestas circunstâncias, combinei de fazer uma visita quando voltasse de sua viagem.

Nesta época, Paola ainda crescia no ventre de minha esposa, e queríamos muito que ele fosse seu padrinho. Mas não poderia imaginar a triste surpresa que me aguardava...

Quando liguei para dizer que iríamos para Araraquara, uma voz feminina atendeu seu telefone. Primeiramente pensei que pudesse ter me equivocado de número, depois imaginei que o Feijão estivesse em algum procedimento e uma enfermeira atendera o telefone, mas depois notei que aquele tom desolador daquela voz, estava prestes a anunciar uma desgraça...

Há muito tempo, quando passávamos pelo estágio de psiquiatria, discutíamos sobre os suicidas... e sem titubear me disse que se um dia tivesse idéia de se matar, faria uma indução anestésica e depois injetaria curare...

O fato é que aquele sorriso sempre estampado em seu rosto, não traduzia os reais sentimentos do meu amigo. E ainda me pergunto até hoje, que se ainda fôssemos próximos, não poderia ter mudado o seu destino...

Já se passaram 4 anos do fatídico acontecimento. Paola está com 4 aninhos. É uma menina alegre, carinhosa, inteligente e bem humorada. Ontem me perguntou quem era esse moço da foto. E eu respondi que era meu irmão. Me perguntou onde é que ele está. Eu respondi que estava brincando com a bisa Adelaide e o Bilu.


7 comentários:

  1. Caramba, BG... Deu ateh um aperto no coração de lembrar q o Feija's partiu... Eh ateh dificil de acreditar... Grande Abraço...

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  2. Querido BG, adorei reviver momentos tão intensos através da sua narrativa marcante e detalhista. E o melhor foi poder recordar do nosso também querido irmão Feija's com tanto carinho. Adorei seu blog e já me tornei sua seguidora. Esses flashbacks famemenses fazem bem a alma. "A saudade é o amor que fica". Beijão. Anna Valéria

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  3. Amigo...
    esse post foi de arrepiar.
    Quando lembro da convivência com vcs , incluindo o Feijão. Éramos vizinhos de frente na rua Setembrino ....
    As lágrimas aparecem....

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  4. Pois é Stenião, de vez enquando ainda dá aquele nó na garganta! Um forte abraço

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  5. Boa Tarde meu amigo BG.. me emocionei muito com tudo que li e realmente fico feliz em saber o que meu irmão representa para voce até hoje.

    QUE VOCE, A MONICA E A PAOLA SEJAM MUITO FELIZES.

    GRANDE ABRAÇO A TODOS.

    ANDRÉ AMARAL

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